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Após Dois Anos de Reestruturação, CVC Corp Aposta na Tecnologia sem Perder a Tradição

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Existem marcas que são tão fortes em seus setores que mesmo aqueles que não são consumidores ou público-alvo são capazes de reconhecê-las como referência. A CVC, da família Paulus, é quase sinônimo de turismo no Brasil, ocupando um grande espaço no imaginário popular. 

Fundada em 1972, em Santo André, a companhia passou de uma empresa vendedora de passagens rodoviárias para um dos maiores grupos de viagens da América Latina. Atualmente, são nove marcas sob o guarda-chuva da holding — que tem atuação no Brasil e Argentina — e uma receita anual de cerca de R$ 1,4 bilhões. 

Os últimos anos, no entanto, estiveram longe de ser um céu de brigadeiro para a companhia. Os problemas começaram antes mesmo da crise do coronavírus afetar todo o setor de turismo e apagar trilhões de dólares das bolsas de valores globais em 2020.

No início daquele ano, a CVC adiou a divulgação dos seus resultados de 2019 devido a indícios de erros e distorções contábeis que, ao fim das investigações, deram origem a um prejuízo de R$ 362 milhões. 

A crise de reputação derrubou membros da diretoria, incluindo o CEO da época, mas não houve tempo para recuperação. O efeito covid-19 somou forças para derrubar os papéis CVCB3 da faixa dos R$ 40 para cerca de R$ 6 em questão de dias — afinal, o isolamento forçado da população no mundo não era o pano de fundo ideal para o turismo. 

Com dívidas superiores a R$ 2 bilhões, a empresa recorreu ao mercado de capitais para tentar estabilizar o caixa e renegociar dívidas. Mais de uma vez. Parecia uma daquelas situações em que o mercado financeiro vê a morte de um gigante. A companhia, que hoje vale R$ 1,25 bilhão na bolsa e já flertou com um valor de mercado de R$ 10 bilhões em 2019, chegou a valer menos de R$ 1 bi durante a crise. 

Os papéis ainda acumulam uma desvalorização de 80% desde o IPO, feito em 2013, mas o cenário começa a mudar para a companhia. Desde o início do ano, as ações CVCB3 já se valorizaram 58% e são negociadas na faixa dos R$ 2,30. 

CVC: início da virada de página

O turnaround não começou do nada. Entre a descoberta das fraudes, a turbulência do coronavírus e altas do dólar, fortemente prejudiciais ao setor de turismo, a companhia tentou reestruturar dívidas, injetar dinheiro no caixa por meio de ofertas secundárias na bolsa em tentativas (frustradas) de recuperação da confiança do mercado. 

O modus operandi de crise reputacional e econômica seguiu até meados de 2023. A família Paulus, fundadora do negócio e que havia deixado o comando do grupo em 2018, viu ali uma chance de não só retomar às rédeas como também levar a CVC de volta às suas origens na busca pelo sucesso. 

Com a injeção de capital veio também um outro nome conhecido da companhia — o de Fábio Godinho, colaborador de longa data da família fundadora, seja na CVC ou em outros empreendimentos. O executivo, que já tinha outras duas passagens pela empresa, dessa vez veio para assumir a cadeira de CEO. 

“Estávamos em um momento de retorno interessante para o ativo, porque sabíamos do potencial não só da CVC, mas do grupo CVC Corp como um todo”, conta o executivo em entrevista à Forbes Brasil. ” Como nós [Godinho e família Paulus] conhecemos muito do setor e do potencial do grupo, tínhamos uma cartilha muito clara do que fazer”. 

Com aval do Opportunity, um dos acionistas de referência na época, as mudanças começaram. Godinho já chegou ao cargo familiarizado com esse tipo de operação. Em sua primeira passagem pela companhia, participou do processo de venda de parte do grupo para o fundo Carlyle. Depois, como presidente da Webjet, preparou-a para uma abertura de capital que acabou não ocorrendo devido à venda das operações para a Gol. De volta à CVC, esteve nos bastidores da operação de IPO, em 2013, para depois, na GJP Hotéis, liderar um processo de reestruturação que culminou na venda da maior transação do setor para a época. 

O plano-base 

Com experiência em reestruturações, Godinho aponta que o conhecimento de todos os segmentos do turismo — dos hotéis, passando por empresas aéreas até chegar na intermediação com agentes de viagens — foi uma das razões para o seu retorno bem-sucedido ao cargo. “Quando eu me sento com um hoteleiro ou uma companhia aérea para conversar, eu entendo as suas dificuldades. Somos os maiores clientes deles tanto para lazer quanto para o segmento corporativo. Essa experiência de ter passado por todos os setores e as vidas anteriores na CVC me ajudaram bastante”. 

O plano de reestruturação foi desenhado em três etapas. Primeiro veio o modo sobrevivência, com a necessidade de renegociar dívidas e uma mudança no modelo de negócios, que voltou a ser centrado nas lojas físicas e redução dos custos. O foco foi capitalizar a empresa e administrar os passivos e ativos e realizar a negociação das debêntures que traziam um risco quase que imediato de liquidez para a companhia. 

Além disso, houve um ajuste na governança corporativa, gestão e cultura da empresa, com o retorno de especialistas em turismo para funções estratégicas dentro da companhia.  “Não adianta ter um conselho muito lindo, uma gestão maravilhosa se a empresa não tem o norte pra onde ela quer ir. Precisávamos resgatar essa cultura da assistência e paixão por vender como razão de existir da CVC”, conta o CEO. 

Em uma segunda etapa, a CVC apostou na construção de uma “fundação” do que seria a companhia nos próximos 50 anos — uma empresa mais moderna, mas com a mesma cultura do seu início. Dentre alguns dos trabalhos esteve a ampliação do “figital” — estratégia que alia o uso de tecnologia dos canais digitais e a presença física. Agora, o foco está em um forte investimento em tecnologia e na continuidade do crescimento físico, com o objetivo de atingir uma penetração cada vez maior. Para 2025, a expectativa são de 200 novas lojas. 

Com forte crescimento na operação argentina e até mesmo perspectivas de adiantamento do pagamento de dívidas, Godinho falou à Forbes Brasil sobre o processo de reestruturação da CVC Corp, as dificuldades que levaram a companhia à crise e ao novo momento do turismo brasileiro. Confira os melhores momentos da conversa abaixo. As respostas foram editadas para maior concisão e clareza. 

Forbes: Qual foi a empresa que você encontrou nesse retorno para a CVC em 2023? 

Fábio Godinho: Nós encontramos uma empresa que, de certa forma, tinha perdido a sua essência e propósito. Ela estava em um momento de tentar se transformar em uma empresa turistech, mas a CVC é uma empresa de turismo. Há mais de 50 anos fazemos uma coisa só que é prestar assistência ao nosso passageiro, ao agente de viagem e ao nosso cliente aéreo. Isso é o que nós fazemos, a tecnologia é apenas um meio 

Não somos uma empresa transacional e sim uma companhia relacional. A CVC tinha perdido a sua relação com o mercado, com as cias aéreas, hoteleiros, agentes de viagem e com o cliente final. Perdeu também a relação com nossa base de franqueados. Com isso, ela se desconectou demais da gestão de oferta e demanda. Tecnologia está cada vez mais no nosso coração, mas para continuar entregando o nosso objetivo final que é a melhor assistência e preços competitivos. 

 Isso era feito de uma forma há 20 anos, hoje usamos o Whatsapp e inteligência artificial e não sei como isso será feito daqui 10 anos, mas tentaremos prestar o mesmo serviço com a tecnologia vigente. 

Você falou sobre voltar a se aproximar dos seus fornecedores como um dos caminhos do sucesso para uma empresa como a CVC. Como fazer isso em um momento em que, no pós-pandemia, as principais empresas aéreas e outras áreas do turismo também passam por grandes dificuldades? 

Tem que estar próximo do seu fornecedor.  Tem que estar ao lado dele quando ele está bem e quando não está. A gente tenta estar ali junto, entendendo onde é que dá pra crescer, onde é que o parceiro está precisando que a gente entre com venda.

Por exemplo: tem hora que a companhia aérea está precisando vender com mais antecedência. Então, fazemos campanhas na CVC de férias antecipadas. Agora, tem hora que o problema é outro. Tem espaço sobrando no voo do Santos Dumont para Brasília nas próximas duas semanas? Quem resolve é a Rextur Advance, que tem foco no curto prazo com um ticket mais alto. Fazemos um verdadeiro esforço comercial. 

A venda direta das companhias aéreas representa metade do total, mais ou menos, mas o valor dessa receita é mais baixo. O passageiro que compra direto no site da aérea paga menos. Já os canais indiretos — agências, consolidadoras, operadoras — entregam um ticket maior. A gente ajuda a companhia aérea a ser mais rentável. 

Por isso tem que estar perto. Porque a demanda muda o tempo todo. Uma hora é vender Maceió para janeiro do ano que vem. Na outra, é encher voo pra Argentina. Você tem que estar praticamente dentro da companhia aérea para conseguir ajudar de verdade. Nós vendemos R$ 15 bilhões ao ano. Essa é uma demanda super importante. 

Hoje a grande aposta da CVC está no “figital”. O que está por trás disso? 

Estamos construindo uma empresa mais moderna e adequada ao mercado atual. Antes da pandemia, a CVC era uma empresa 100% física. A venda só acontecia com o cliente entrando na loja. Mas a gente entendeu que esse modelo, sozinho, não para mais de pé. E não foi um achismo. Fizemos pesquisas e ouvimos o cliente.

O que descobrimos foi que depende muito do tipo de viagem. Viagens mais curtas, com pouca antecedência, ticket médio mais baixo, o cliente compra direto no online. Ele assume o risco e faz tudo sozinho. Mas quando a viagem é mais longa, mais cara, com mais planejamento, o cliente quer falar com alguém. Quer ter suporte, roteiro, ajuda para organizar. E aí entra o agente de viagens.

Só que entre o 100% físico e o 100% digital, existe um meio do caminho. A gente chama de “figital”, ou omnicanalidade. O cliente começa a jornada no digital, mas termina com alguém da CVC — muitas vezes sem nem pisar na loja. Hoje, metade das nossas vendas já acontece assim: captamos o cliente online, ele cai no nosso sistema próprio via WhatsApp, e fecha com um agente. Tudo monitorado, com sistema integrado. 

Isso nos deu a possibilidade de redesenhar o modelo de loja. Antes, a loja da CVC era grande, cara de abrir e cara de manter. Agora, não precisamos mais de ponto nobre ou cidade grande. Criamos um formato de loja menor, mais enxuto. Hoje, temos franqueados em cidades com menos de 20 mil habitantes, que antes não faziam sentido pra CVC.

Acredito que o figital vai representar 60% a 65% das vendas no futuro. Ainda vai existir o cliente que entra direto na loja, mas o crescimento vem mesmo da combinação. O que estamos vendo é que as lojas estão vendendo mais justamente por esse movimento figital. Elas continuam atendendo quem já ia presencialmente, mas agora ganham um público novo que vem do digital. Um exemplo claro é a faixa etária de 18 a 25 anos. 

Com o balanço reorganizado e reestruturação operacional, vocês apontam estar entrando em um novo momento. Pode falar um pouco sobre como a tecnologia é o novo foco da CVC? 

A parte financeira está resolvida, as estruturas estão no lugar, e o foco virou crescimento com base em tecnologia. Mas sem perder a essência do que nos trouxe até aqui — confiança, proximidade e experiência no relacionamento com o cliente. Agora, estamos entrando em uma nova fase: o plantio de outras coisas, principalmente ligadas à tecnologia. Não tem como crescer no turismo sem investir pesado em tecnologia.

Esse terceiro momento é muito mais voltado ao futuro. Estamos implementando inteligência artificial dentro da operação, tanto para melhorar a experiência do cliente, quanto para dar mais eficiência para quem está na ponta, vendendo. A jornada está mudando. E a CVC precisa mudar com ela.. Mas não é tecnologia pela tecnologia. Ela entra para simplificar, dar agilidade, e manter o atendimento humano quando for necessário. Esse equilíbrio é o que sustenta o modelo figital.

Estamos investindo também em automações que ajudem o agente a ser mais produtivo. Queremos que ele foque no que importa: entender o cliente e fechar a venda. O resto, o sistema resolve. Com isso, a gente ganha escala, sem perder personalização.

Quais são os grandes objetivos para o futuro e quais são os maiores riscos? Há planos para aquisições?

A gente já vem ganhando mercado de forma consistente, especialmente no B2B. A Rextur Advance retomou a liderança no segmento de consolidação aérea. A Trend ultrapassou R$ 1,2 bilhão em vendas no ano passado. E a Visual, que era uma marca adormecida, deve fechar o primeiro ano com R$ 250 milhões em vendas.

No B2C, a transformação figital da CVC tem sido fundamental. Queremos estar cada vez mais próximos do cliente. Ainda pensamos em crescer bastante em loja física. Só no Brasil, tem mercado para chegarmos a duas mil unidades. No B2B, seguimos diversificando.

Essa diversificação é uma das forças da CVC. No ano passado, mesmo com a companhia ainda em processo de reestruturação, o B2C cresceu mais de 10% e o B2B avançou quase 3%. Agora, com as três frentes mais organizadas, já começamos a colher os resultados: só no primeiro trimestre deste ano, crescemos 30% em receita bruta.

Quanto aos riscos, os maiores vêm da taxa de juros no Brasil, que é uma das mais altas do mundo — o que afeta o consumo, não só pra gente, mas para todo o setor. E no cenário internacional, os conflitos geopolíticos ainda trazem impacto direto nas viagens. Quando começou o conflito recente no Oriente Médio, por exemplo, tivemos muitos cancelamentos para Israel, para a região como um todo, e até voos suspensos de companhias como Emirates e Qatar.

Sobre aquisições: agora que a casa está em ordem, tanto financeiramente quanto na estratégia das empresas que já temos, começamos a olhar oportunidades. Mas, com a taxa de juros no nível atual, é difícil fazer qualquer M&A que se sustente. Por ora, o foco é seguir investindo nas empresas que já fazem parte do grupo e continuar avançando na transformação digital.

 

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